Vítimas da moda: epidemia de vestidos trapézio, franjões e bolsões
Malu Fontes
Revista Metrópole n. 08, janeiro de 2008
Todo dia elas saem todas sempre iguais... A afirmação poderia ser mais uma referência torta à canção "Cotidiano", de Chico Buarque, mas, infelizmente, é apenas um diagnóstico sarcástico do estilo, ou melhor, da falta de estilo, da mulherada urbana. Justiça se faça: a mulherada que se acha antenada e pensa que estar na moda é ser cover e over de e em tudo de ruim que a indústria do vestuário ou a falta de gosto da feminice um tantinho mais abastada dita e ostenta nas páginas das revistas ou na tela da TV.
Nos últimos meses, com a proximidade do verão, a cidade, sobretudo os points freqüentados por quem tem na carteira uns trocados que permitem a renovação do guarda-roupa, está infestada, literalmente por uma orda de mulheres todas vestidas do mesmo jeito e com o mesmo acessório. O fenômeno pode ser descrito como uma epidemia fashion e os editoriais de moda há muito têm um adjetivo para aplicar a quem sucumbe a esse tipo de falta de personalidade: fashion victms. Em bom Português: vítimas da moda. Em outras palavras: gente incapaz de escolher para si o que lhe cai bem sem copiar o que vê pela frente e que acredita que estar na moda é aderir acriticamente ao que está nas vitrines, no corpo da mocinha da novela do horário nobre ou das mulheres hit, como Ivete Sangalo e Joelma, a estrela sobre botas esquisitíssimas da Banda Calypso.
A epidemia é formada por mocinhas, mulheres e até mesmo senhorinhas de meia idade que se agarram à vã e desesperada crença de que um botox aqui e uma esticadinha ali vão lhes garantir uma permanência eterna na casa dos 20. Em comum, apesar dos desníveis da faixa etária, o mesmo modelinho de vestido ou batinha, sempre associado a uma bolsona enoooorme, preferencialmente prateada de tal modo que ofusca os olhos mais sensíveis e onde cabe com folga todo o estoque made in China do tabuleiro de qualquer camelô, seja da Avenida Sete, em Salvador, ou da 25 de março, em São Paulo, quando chegam os agentes do rapa. Aliás, custa a crer que o tamanho dessas bolsas não foi inspirado no style dos sacoleiros.
Mais estranho ainda é o fenômeno da falta de noção que acomete as mulheres mais baixinhas e as leva a aderir a tal modismo. Quando aliam a tal bolsa-gigante a uma mimosa sandalinha rasteira, impossível fugir da associação imediata à figura de uma anã. Se usam um saltão desses de acrílico ou daqueles pesadões de madeira que parecem devastar um tronco da mata atlântica para a construção da base/plataforma, ficam com cara de egüinha pocotó bípede das alamedas de griffes dos melhores shopping centers da cidade.
Voltando aos tais vestidinhos e batinhas que todo mundo resolveu ter um e usar no mesmo dia e no mesmo lugar, ambos comumente atendem, nos editoriais de moda e na boca das vendedoras que aprendem a repetir o termo sem saber do que tão falando, os tais atendem pelo nome de 'trapézio' e suas estampas são de três sub-tipos: há as de inspiração étnica, os de inspiração floral e as que se inspiram em grafismos daqueles que gente entediada fica rasbicando em reuniões chatas.
Para compor o tipo completo, está também na última moda, o franjão a la Ivete Sangalo (independentemente do tipo, da textura, do volume e da qualidade do cabelo e também à revelia do tipo de alisante usando na escova progressiva, definitiva ou que tais). E independentemente também, claro, da idade da dona. E aqui entre nós: tem coisa mais grave que uma senhorinha de franja, franjinha ou franjão?
E quem nunca foi vítima de uma pegadinha involuntária ao estar em um corredor de shopping ou num restaurante japonês da moda (sim, os restaurantes japoneses da moda são o habitat preferido do tipo descrito nessa coluna, ou seja, aquele fantasiado de vestidinho trapézio – melhor ainda se vier acompanhado de um bom e velho legging por baixo, sobretudo naquelas em que as celulites ficam visíveis até mesmo SOBRE o tecido): uma mulher de costas com toda a pinta e modos de vestir de uma típica adolescente de 17. De repente, ela vira-se e o observador leva um susto, acreditando que assistiu a uma transformação do tipo túnel do tempo. Trata-se de uma senhorinha há muito passada dos 50. Ao lado dessas espécies costuma serem vistos uns exemplares masculinos que fazem a linha gatalho (gato velho pra caralho): uma calça mais esportiva com uma camisa de um tipo de malha que está mais para lycra suplex ou neoprene, daquele do qual é feito a roupa dos surfistas. No mínimo uma malha mais encorpada, mas sempre justíssima, para definir o peitoral, que fique claro. Uma coisa assim meio peru-pavão na versão bípede e de meia idade.
Não, a visão, seja de um tipo ou do outro, não é das mais agradáveis. Sim, não é nada recomendável, em tempos politicamente corretos, ficar prestando atenção a essas idiossincrasias. Que 2008 traga a todos um tiquinho de sensatez, brindando as vítimas da moda com alguma capacidade de escolher uma roupa que lhes dê algum toque de personalidade, estilo e marca pessoal. Na falta disso, que venha um quê de cegueira estética para que se pare de achar tudo isso tão ridículo. E, diante das tragédias e escândalos de todos os tipos em 2007, nada melhor que começar 2008 falando de frivolidades. Como diria Oscar Wilde: dê-me o supérfluo que abro mão do essencial.
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