quarta-feira, 2 de junho de 2010

Quem mantém o tráfico é o usuário

Ferreira Gullar

Só uma operação em larga escala, que envolva famílias, escola e Estado, poderá deter o avanço da droga

Sei que o combate às drogas é um assunto polêmico e realmente de difícil solução. Sei também que as pessoas que se empenham nesse combate estão de boa-fé e convencidas das posições que defendem.
Um dos pontos mais difíceis de abordar é a repressão ao usuário de drogas, que é visto não como um contraventor, mas como uma vítima da dependência química. De fato, não teria sentido tratar o viciado, que não consegue livrar-se da droga, do mesmo modo que o traficante, que se vale disso para ganhar dinheiro. Não obstante, me pergunto se todos os que consomem drogas são efetivamente dependentes, sem condição de livrar-se delas.
Já abordei aqui este assunto, quando usei do seguinte argumento: assim como a maioria dos consumidores de bebidas alcoólicas não é constituída de alcoólatras, também a maioria dos consumidores de drogas as consome socialmente. Em grande parte, é gente de classe média alta e até mesmo executivos. Não podem ser vistos pelas autoridades do mesmo modo que os consumidores patológicos.
Este é um aspecto importante a ser considerado no combate às drogas, uma vez que o consumidor é o fator decisivo para a manutenção ou extinção do tráfico: não haverá comércio de drogas se não houver quem as compre. Sem consumidor, não há produção nem mercado. Insisto neste ponto porque, como disse acima - e todos o sabem - será impossível extinguir o tráfico (e mesmo reduzi-lo drasticamente) se o número de consumidores se mantiver alto.
E o fato é que o consumo de drogas cresce de ano para ano. Se se admite, portanto, que é o consumidor quem garante a existência e expansão do tráfico, não resta dúvida de que é nele -no consumidor- que reside a chave do problema. Atualmente, prepondera o combate direto ao tráfico, de que resulta uma verdadeira guerra, travada, quase sempre, nos subúrbios e nas comunidades pobres, que enfrentam grandes dificuldades para se manter e a suas famílias, e pagam alto preço pelas consequências dessa guerra. E ao que tudo indica, com poucos resultados positivos.
O tráfico continua a se expandir, envolvendo em suas malhas jovens cada vez mais jovens e até mesmo crianças cooptadas em suas escolas. Paremos para refletir: se é o consumidor que mantém o comércio de drogas, não é evidente que o modo efetivo de combatê-lo é reduzir progressivamente o número de consumidores?
O erro cometido até aqui - se não me equivoco - terá sido reprimir tanto o traficante quanto o usuário de drogas, sem distinguir entre estes os que se drogam por necessidade patológica e os que o fazem socialmente. Mas, de qualquer maneira, a simples repressão, tanto ao usuário quanto ao traficante não resolverá o problema. Por estar convencido disso, proponho que se encare essa questão a partir do consumidor, ou seja, impedindo que o número destes continue a crescer e, mais que isso, tentar reduzi-lo progressivamente.
Talvez as pessoas, que ainda não refletiram seriamente sobre o problema, tenham dificuldade de considerá-lo em sua verdadeira dimensão. Sem exagero, a droga, como fenômeno mundial, pode ameaçar a própria civilização, já que se vale da juventude, isto é, daqueles que amanhã terão a sociedade em suas mãos. Afora isso, a simples destruição de uma vida ou de uma família já justificaria todo o esforço possível para resolver tal problema.
Por essa razão mesmo, acredito que o objetivo principal da luta a ser travada é manter os jovens e as crianças fora do alcance do traficante. Estou convencido de que só uma operação em larga escala, que envolva não apenas as famílias, mas também a escola e os órgãos do Estado, poderá deter o avanço da droga. Não se trata de simplesmente promover uma campanha de esclarecimento, acreditando que isso seria suficiente. Não o seria.
Trata-se, a meu ver, de um trabalho permanente a ser desenvolvido por todos os setores da sociedade, devidamente organizado e mantido, evidentemente, pelo governo, com a participação da sociedade. Um trabalho de reeducação e esclarecimento em caráter permanente, visando o futuro, mas implantado depois de muita reflexão e cuidadosamente elaborado. Tarefa para os novos governantes.

Projeto extingue prisão especial para formados

Fim do privilégio
A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania aprovou, nesta terça-feira (1º/6), o fim da prisão especial para quem tem nível superior e a detentores de cargos e de mandatos eletivos. A prisão especial só poderá ser concedida quando houver necessidade de preservação da vida e da integridade física e psíquica do preso, reconhecida pela autoridade judicial ou policial.
Essa é uma das medidas acatadas pelo relator do projeto de lei na CCJ, deputado José Eduardo Cardoso (PT-SP), para o substitutivo do Senado, com emendas, ao Projeto 4.208/2001, do Poder Executivo. O projeto faz parte da Reforma do Processo Penal, iniciada em 2001. O texto foi aprovado originalmente pela Câmara em junho de 2008 e está em análise novamente na Câmara devido às modificações feitas pelos senadores. A proposta precisa ser votada ainda pelo Plenário.
Em 2007, o Grupo de Trabalho de Direito Penal e Processual Penal apresentou emenda substitutiva global que, aprovada, seguiu para o Senado. De acordo com o coordenador do grupo, deputado João Campos (PSDB-GO), a aprovação da matéria é fundamental para a celeridade e efetividade da Justiça e o combate à impunidade.
O projeto tem urgência, já foi aprovado pela Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado e ainda será votado pelo Plenário.
Medidas cautelares
A CCJ também aprovou restrição ao poder do juiz de decretar medidas cautelares durante a investigação criminal. Ele poderá fazê-lo somente por requisição da autoridade policial ou do Ministério Público. De acordo com o relator, esse mecanismo adapta o sistema à Constituição Federal, que prevê que o juiz não deve ter iniciativa na investigação criminal.
O deputado também acatou a proposta do Senado que obriga o juiz ou tribunal que decretou a medida cautelar, inclusive a prisão preventiva, a reexaminá-la a cada 60 dias, no mínimo, para avaliar se persistem seus motivos. A decisão deverá explicar os motivos da manutenção ou mudança.
Também foi aceita a alteração do Senado que entendeu que, no caso de infrações afiançáveis, deve ser decisão do juiz arbitrá-la ou não, dependendo de sua avaliação acerca do investigado ou acusado. A proposta aprovada determina ainda que o juiz que pedir a prisão de alguém em outra comarca, deverá providenciar sua remoção em, no máximo, 30 dias. Caso não o faça, o juiz a quem foi solicitada a prisão poderá libertar o preso.
O texto aprovado originalmente na Câmara já previa que os presos provisórios ficassem separados daqueles condenados em definitivo. O Senado acrescentou que os militares presos em flagrante e o desertor ou insubmisso preso por autoridade policial deverão ser recolhidos a quartel da instituição a que pertencerem.
Comunicação à família
A nova redação prevê que a prisão de qualquer pessoa e o local em que se encontre devam ser comunicados, além da família e do juiz, também ao Ministério Público. A justificativa é que é o MP que tem a atribuição de zelar pelo respeito aos direitos constitucionais dos presos e exercer o controle externo da atividade policial.
O Senado permitiu que o preso condenado por crimes com pena mínima superior a dois anos, com residência e trabalho fixos, possa dormir em casa e lá permanecer nos dias de folga. O texto da Câmara não permitia esse benefício.
Com relação ao instituto da fiança, foi aceita a proposta de que ela pode ser aumentada em até mil vezes. A Câmara havia proposto originalmente cem vezes. Também na nova redação, foi aceita a ideia de que a fiança possa ser quebrada caso se cometa uma nova infração intencional. Caso o preso não tenha condições financeiras por motivo de pobreza, o juiz poderá liberá-lo provisoriamente sem pagamento.
Mandados de prisão
João Campos apontou, entre as principais mudanças da proposta aprovada nesta terça-feira (1º/6) pela CCJ, a criação de um banco de dados a ser mantido pelo Conselho Nacional de Justiça com todos os mandados de prisão expedidos no país.
Assim, caso alguém que cometeu um crime num estado poderá ser preso em outro sem a necessidade de o juiz do local do crime solicitar a prisão ao do local em que o acusado se encontra, o que retarda ou impossibilita a prisão. O substitutivo do Senado prevê que qualquer policial pode efetuar a prisão decretada mesmo sem o registro no CNJ, desde que comunique o juiz que a decretou. Este deverá providenciar em seguida o registro. Com informações da Agência Câmara.
PL-4208/2001

Homem que matou mulher é julgado à revelia

Réu foragido
Começou nesta terça-feira (1º/6) em Pernambuco o julgamento de José Ramos Lopes Neto acusado de matar a ex-mulher, Maristela Just, na frente dos filhos, há 21 anos. O julgamento correrá à revelia, já que o réu e o advogado não compareceram à sessão. A notícia é do Diário de Pernambuco e do O Globo.

Os dois jovens, que na época do crime tinham 2 e 4 anos de idade e também foram vítimas do próprio pai, que atirou neles, escreveram uma carta endereçada aos desembargadores do Tribunal de Justiça de Pernambuco. O documento foi protocolado na última segunda-feira (31/5) no Palácio da Justiça. A carta visa sensibilizar os desembargadores para que eles neguem qualquer recurso da defesa caso o pai seja condenado.

No julgamento marcado para o último dia 13 de maio, o acusado e o advogado de defesa não compareceram e o júri foi adiado para esta segunda-feira. O advogado foi multado em 50 salários mínimos, o equivalente a R$ 25,5 mil, por não ter comparecido.

Uma vez que José Ramos está sem advogado, a juíza Inês Maria indicou os dois defensores públicos Flávia Barros de Souza, chefe do Núcleo da Defensoria de Jaboatão dos Guararapes, e José Inaldo Cavalcanti Júnior, para acompanhar o réu. A decisão da magistrada é um dispositivo jurídico para evitar que o julgamento se dissolva de novo.

O julgamento será no Fórum de Jaboatão dos Guararapes, na Grande Recife. A juíza Inês Maria de Albuquerque confirmou que a prisão preventiva dele foi pedida desde o dia 19 de maio, mas que estava sendo mantida em sigilo para garantir a captura. Lopes Neto não foi encontrado na casa dele, nem da do pai. A partir de agora, ele é considerado foragido.

A Defensoria Pública, que está representando a defesa do réu, informa ainda que não foi procurada por ele. “Desde o júri passado a gente já estava com dados do processo. Já estudávamos. O tempo foi razoável”, contou José Inaldo Cavalcanti.

Das 25 pessoas chamadas para compor o conselho de sentença, sete foram escolhidos, sendo quatro mulheres e três homens. A partir de agora, eles ficam incomunicáveis. A sessão foi suspensa para almoço e recomeça em uma hora, com o depoimento das vítimas, os filhos de Maristela.
Segundo o Tribunal de Justiça de Pernambuco, serão ouvidas as duas vítimas, três testemunhas de acusação e uma de defesa. As outras testemunhas que seriam ouvidas não foram localizadas. A primeira a ser ouvida será a filha de Maristela, Natália Just.

Caso

Maristela Just foi morta na casa dos pais, no bairro de Piedade, em Jaboatão dos Guararapes, Pernambuco. De acordo com as investigações, José Ramos Lopes Neto, que estava separado da mulher havia dois anos, foi à residência no dia 4 de abril de 1989. Lá, ele se trancou com Maristela e os filhos do casal em um dos quartos. José Lopes teria dado três tiros na ex-mulher, um tiro no filho, então com 2 anos, e outro no ombro da filha de 4 anos.

O irmão de Maristela, Ulisses Just, foi baleado quando tentava socorrer a irmã e os sobrinhos. José Ramos, que é filho do advogado criminalista Gil Teobaldo, chegou a ser preso. Ficou por um ano no presídio Aníbal Bruno e prestou vários depoimentos. Foi solto depois de um Habeas Corpus concedido pela Justiça.